segunda-feira, 11 de abril de 2011

Herculano Neto

“DE ALMA INGÊNUA, ACREDITO”

Não me vejo namorando na Praça da Bandeira, atrás do prédio da cadeia, nem passeando com minha roupa de domingo pela Praça da Purificação, essas praças não me pertencem mais. Me vejo apenas na Praça do Rosário, correndo descalço atrás do bonde, brincando de esconde-esconde no Largo da Cruz (1,2,3: achei você!). Me vejo nos atalhos do Maricá, trocando alumínio por Grapette, espantando maruins na descida do Tauá, “roubando” bananas no beco de Narciso, anoitecendo no tamarineiro.

Sou eu tocando trompete na Santa Mazorra de Dona Zica, bradando “É Maro-Maro” no gol de Careca, acordando com os pés dentro d’agua na casa inundada, imitando Besouro contra Bruce Lee, saudando o camarada Maru, a velha Domingas, Seu Chiquinho do Apolo. Sou eu aos prantos cantando “Trilhos Urbanos” no adro durante as festas, pedindo silêncio para escutar a nota de falecimento no beco da Rencau, recitando “Papai Noel – Pólo Norte” no Teodoro.

Não sou estrangeiro, sou nativo.

Sou Calolé, Destilaria, Conde e Pilar. Sou Campo do Arroz, Colibri, Ideal e Botafogo. Sou São Francisco, São Bento, São Brás e São José. Sou Timbó, Acupe, Viúvas e Virgens. E quero a brisa vespertina do Senado; Geração 80 e Confronto; 2001 no Cine-Subaé; poesia na Selibasa; Sangue e Raça e Uhuru-Eby; A Sineta e O Ataque. Quero as glórias do passado no presente.

Não sou a interseção entre a rua direita e a estrada dos carros, não ostento sobrenome escravocrata. Sou índio do Trapiche, descendente dos Carijós. Sou bicho do mato, retraído tal qual a folha do não-me-toque.

Não sou de santinho, meu santo é grande, meu santo é forte, meu santo é doce, meu santo é amaro.

Caminhando pela cidade, vejo um menino sozinho, sentado num banco da praça. Aquela praça não me pertence mais (constatação sem lamento), mas ainda me vejo nos olhos daquele menino.

No perigo e na bonança dessa gente morena, estou.

Um comentário:

www.obomdoacupe.com disse...

Incrivel o jogo de palavras, muito bom!